Campeão mundial aos 16 anos com Ronaldinho Gaúcho. Aos 20, do Brasil com Romário. A estreia pelas mãos de Luis Felipe Scolari. Convite para jogar num gigante do futebol sul-americano por Carlos Bianchi.
Jorge Henrique Amaral de Castro Nascimento poderia resumir o currículo no futebol em poucas palavras. Em noite de Boca Juniors e Palmeiras pela Libertadores – nesta noite de quinta-feira, às 21h30, pela partida de ida da semifinal da Libertadores -, o ex-lateral Jorginho Paulista, como ficou conhecido no futebol, nem pensa em ficar em cima do muro para decidir o lado da torcida:

Jorginho, hoje aos 43 anos, mora em São Paulo, mas trabalha para empresa da Europa — Foto: Reprodução
Jorginho, hoje aos 43 anos, mora em São Paulo, mas trabalha para empresa da Europa — Foto: Reprodução
– Sou palmeirense. Fiquei dos 10 aos 18 anos no Palmeiras. Joguei no Vasco, no São Paulo, no Cruzeiro, no Botafogo, mas eu cresci no Palmeiras. Você aprende a gostar – conta Jorginho, hoje com 43 anos, paulista da Vila Mariana.
Numa trajetória que foi comum a alguns jogadores na década de 1990 e 2000, Jorginho dividiu o campo com o salão em parte da carreira – até mesmo quando estreou pelo Palmeiras aos 16 anos, chamado por Felipão, ele ainda jogava pelo time da GM, a General Motors, que remunerava muito melhor os atletas do que na base palmeirense na época.

Ao lado de Riquelme no Boca — Foto: Reprodução
Ao lado de Riquelme no Boca — Foto: Reprodução

Jorginho com a camisa do Palmeiras — Foto: Reprodução
Jorginho com a camisa do Palmeiras — Foto: Reprodução
– Fui campeão mundial sub-17, no Egito, estreei com o Felipão ali em 1997 e ainda seguia jogando futsal. Eu não tinha contrato profissional nessa época – recorda.
Ainda nos aspirantes do Palmeiras, lembra de um dia quando Vanderlei Luxemburgo decidiu colocar Djalminha, astro do time dos 100 gols de 1996, descer para jogar com a garotada.
– Foi muito engraçado, porque o jogo era 11h. Ele chegou muito mamado, muito louco para jogar – lembra, aos risos.
– Mas nos aspirantes tinha aquelas faltas que eram da meia-lua, mesmo assim ele pegou e fez o gol.
Lateral ofensivo, quase ambidestro, Jorginho foi campeão brasileiro ao lado de Romário no Vasco – ele virou Paulista por atuar no mesmo time que outro campeão mundial pela seleção brasileira, o então volante e ex-lateral Jorginho. Marcou um na final contra o São Caetano (3 a 1 no Maracanã) e até hoje não esquece os dias de Vasco, os que considera os mais marcantes no futebol brasileiro.
– Igual o Baixola não tinha igual. O Vasco concentrava num hotel do lado da (boato) Help, era uma bagunça, um carnaval. Rio de Janeiro né. Romário não gostava de concentrar, não bebia nada. Só Coca light. Lembro que no intervalo dos jogos, o Gato (roupeiro, falecido em 2012) vinha com a coquinha prateada para ele – recorda.
A saída para a Holanda
Hoje com a experiência de quase 10 anos no mercado da bola, agora, digamos, do outro lado do balcão, Jorginho entende que houve amadorismo na sua saída do Palmeiras. Hoje ele trabalha na empresa fundada por Mino Raiola, o poderoso empresário italiano falecido em 2022 – ou simplesmente, “o gordinho” para Jorginho.
A empresa One Sarl hoje é tocada pela advogada brasileira Rafaela Pimenta. O ex-jogador trabalha na captação de atletas nas categorias de base.
– Os europeus têm muito mais informações e dados dos jogadores de base aqui do Brasil do que na minha época. Mais até do que os próprios clubes brasileiros – diz.
Mas a saída de Jorginho não se deu por informações privilegiadas. Apesar de chamar a atenção aos 16 anos no Mundial sub-17, foi numa visita de dirigentes do PSV que descobriram que ele não tinha contrato profissional. Ele foi para a Holanda conhecer as instalações ao lado do pai e não demorou muito para ir de vez numa passagem curta pelo clube que teve Romário e Ronaldo como estrelas.

No PSV, poucos jogos, mas volta olímpica contra o Ajax — Foto: Arquivo pessoal
No PSV, poucos jogos, mas volta olímpica contra o Ajax — Foto: Arquivo pessoal
– O PSV é um time grande da Holanda. Você chega lá, o CT tinha 20 campos, o estádio, Philips, era bem moderno, aquela coisa toda. Lógico que encanta. No Palmeiras eu já tinha ultrapassado jogadores mais velhos na posição, mas o Júnior (lateral-esquerdo campeão pelo Palmeiras e do mundo com a Seleção em 2002) não dava brecha nenhuma. Eu sabia que eu tenho que esperar. Ele jogava todas, não gostava de ficar de fora, então eu sabia que minha chance para ia demorar. Então foi um pensamento também pela oportunidade que apareceu.
Antes de ter experiência para lá de conturbada – por motivos alheios às quatro linhas – na Argentina, Jorginho ainda defendeu a Udinese, quando teve os primeiros contatos com Mino Raiola, que disse tê-lo visto atuando no Mundial do Egito.
– Ele me chamava de “cabeça de pinto” – diverte-se, traduzindo a expressão em italiano que era referência à certa falta de disciplina para seguir vivendo grandes momentos na carreira.

Com a camisa da Udinese, para onde Mino o levou no início do contato entre os dois — Foto: Arquivo pessoal
Com a camisa da Udinese, para onde Mino o levou no início do contato entre os dois — Foto: Arquivo pessoal
A crise Argentina
Quando foi para Buenos Aires, ouviu de Carlos Bianchi, histórico técnico do Boca Juniors, que ele pediu sua contratação quando estava com o Boca no Japão e assistiu a goleada vascaína contra o River Plate (4 a 1), na Supercopa de 1997. Lá, conviveu com Riquelme, Schelotto e outros, num momento de reconstrução do time campeoníssimo dos anos 2000.
A passagem durou pouco muito por conta da terrível crise vivida pelo país vizinho em 2001. Jorginho morava com uma namorada no bairro da Recoleta, na mesma rua do então ministro da Economia Domingo Cavallo.

Com a seleção sub-17 ele foi campeão do mundo na geração de Ronaldinho Gaúcho (camisa 10 ao fundo) — Foto: Arquivo pessoal
Com a seleção sub-17 ele foi campeão do mundo na geração de Ronaldinho Gaúcho (camisa 10 ao fundo) — Foto: Arquivo pessoal
– Lembro que o secretário do clube falou para a gente não sair de casa, mas no clube ainda teve treino no dia seguinte. Quando eu soube dos bloqueios do banco, ainda fiquei mais dois meses, mas meu contrato era em dólar e aí passaria a ser em peso (Nota da redação: a medida do vizinho de Jorginho Paulista atrelou o peso argentino ao dólar). E aí eu ia perder muito dinheiro. Acho que fiz uns 14 jogos só – estima Jorginho, que chegou ao lado de meio time ne época de reformulação no Boca Juniors.
Da partida desta noite, Jorginho vê um Boca mais frágil, mas ainda assim muito perigoso para enfrentar o Palmeiras. Pela força da camisa, tradição e pela Bombonera.
– É um Boca bem abaixo, mas a Libertadores e esses argentinos na Libertadores… aí a torcida inflama, tem a Bombonera que é um campo diferente. O Abel está tentando encaixar o time ainda, perdeu Dudu, algumas peças que não estão mais, como o Danilo, o Scarpa. Para falar a verdade, eu acho que vai ser um jogo medroso. Vai ser um jogo de muita empolgação, mas vejo esse primeiro jogo com muitos cuidados dos dois times – aposta Jorginho.