A Seleção brasileira sub-17 iniciou a Copa do Mundo da categoria neste sábado (11), com derrota de virada e vexatória diante do Irã, adversário com pouquíssima — ou quase nenhuma — relevância no cenário do futebol internacional de categorias de base. Além dos iranianos, os brasileiros ainda enfrentarão na fase de grupos a Inglaterra, atual campeã mundial da categoria, e um adversário ainda menos conhecido que os adversários da estréia, mas que vem chamando atenção na formação de jovens talentos. É a Nova Caledônia.
Talvez você não esteja habituado ou habituada a ouvir falar muito da pequena ilha no oceano Pacífico, conhecida muito mais por mergulhadores, já que é um paraíso para a prática, do que por qualquer outro requisito — ainda mais o futebol. Então vamos do começo: o país fica bem perto da Austrália, uma distância de praticamente 1500 quilômetros. Foi colonizada pela França e, hoje, segue sendo parte da República Francesa, já que a própria população local votou em 1998 para assim continuar sendo, em detrimento a uma proposta independência. Isso faz do local a porção de terra mais distante de seu respectivo país soberano, uma vez que Nova Caledônia e França estão separadas por imensos 16 mil quilômetros.
Por isso o francês é a língua local e, talvez por isso, eles acompanhem os franceses na paixão pelo futebol. Mesmo com poucos habitantes, cerca de 230 mil de acordo com o Censo de 2017, a Nova Caledônia produz talentos. O mais notável deles é Christian Karembeu, que você deve se lembrar por sua passagem pelo poderoso Real Madrid — sim, ele mesmo, aquele que Edílson humilhou jogando pelo Corinthians no Mundial de Clubes de 2000. Mas a ideia é que, em breve, isso mude e mais nomes locais fiquem conhecidos.
Nova Caledônia é laboratório da Fifa para investimento em base
O plano da Fifa é ambicioso, mas não é difícil de entender: até 2026, quando será realizada a Copa do Mundo com sede tripla em Estados Unidos, México e Canadá, a entidade quer ter academias de formação de atletas em todos os países do mundo. Sim, isso é muita coisa. Mas é o que planejam os cartolas e o que a Nova Caledônia recebeu, servindo como uma espécie de laboratório para esse plano, digamos, megalomaníaco, mas que conta com simplesmente US$ 200 milhões em investimentos.
E para o pequeno país da Oceania, estar nesse projeto é simplesmente tudo que eles precisavam. Isolada geograficamente e com uma população pequena, a Nova Caledônia nunca teve lá muitas chances no mundo futebolístico. Está neste Mundial sub-17 e, ao lado de Burkina Fasso, é um dos países que integram a competição e nunca esteve em uma edição sequer de Copa do Mundo profissional. Realidade que, esperam eles, poderá mudar em pouco tempo.
A rota é uma: buscar experiência, evoluir e, quem sabe, chegar a uma Copa do Mundo
Hoje as Eliminatórias da Oceania contam com a Nova Zelândia como principal bicho-papão, uma vez que a Austrália, quase que totalment por conta do desnível, foi jogar na Ásia. E os meninos da Nova Caledônia tiveram seu primeiro contato com os neozelandeses justamente no torneio classificatório para a Copa do Mundo sub-17. Conquistaram a vaga perdendo para os All Black, mas apenas por 1 a 0. Muito para uma equipe que, em sua primeira participação no Mundial da categoria, fez apenas um pontinho, conquistado graças a um empate contra o Japão.
O passo-a-passo da Nova Caledônia é bem estipulado no programa de formação de talentos. Primeiro, acima de tudo, formar jogadores e pessoas. O torneio classificatório foi disputado em Fiji e, para muitos dos garotos, foi a primeira oportunidade da vida de deixar seu país natal. Um feito e tanto, que os fez crescer como pessoas e jogadores — como afirmou o técnico da seleção sub-17, o francês Leo Lopez, em entrevista ao site da Fifa.
“Jean-Philippe Angexetine (atacante e uma das promessas da equipe) parecia um peixe fora d’água em Fiji. Acredito que foi a primeira vez que ele teve a chance de deixar a Nova Caledônia. E é sobre isso, esse é nosso objetivo: combinar a experiência humana com a experiência do futebol, buscar a evolução nestes dois sentidos”, afirmou Lopez.
O próprio treinador destaca sua equipe como “modesta, mas com talento”, e seleciona alguns jogadores que, segundo ele, tem o potencial de dar um salto maior e jogar, por exemplo, no futebol europeu — mesmo que em mercados mais periféricos, o que já seria um avanço e tanto para o futebol do país. São eles os defensores Wadria Hanye, Greg Diko — este, segundo Lopez, um “enorme talento” — e Ronald Nganyane, este capitão da seleção. Ele destaca também dois atacantes: Nolhann Alebate e o já citado Angexetine.
Dez gols sofridos na estreia e preparação para enfrentar um ressentido Brasil
Projeto à parte, a Nova Caledônia segue com seu espírito competitivo de não necessariamente precisar vencer para aproveitar a experiência do Mundial sub-17. Estreou tomando sonoros 10 a 0 dos atuais campeões ingleses, placar elástico, mas esperado — e longe de ser considerado vexatório, dadas as muitas circunstâncias que você acabou de ler.
Agora, pega o ressentido Brasil, que precisa de qualquer modo vencer e fazer um bom saldo de gols para compensar o vexame — aí sim — da derrota para os iranianos na estreia. A derrota brasileira, aliás, deixa um gostinho amargo para a Nova Caledônia, de que, diferente do que aconteceu em 2017, dificilmente o pontinho amigo será conquistado de novo, já que o Irã conseguiu o feito de vencer a Seleção, uma das maiores fábricas de talento do mundo.
Tudo bem. Afinal, são os primeiros passos de um país menor que qualquer capital brasileira, mas com muita vontade de viver o mundo através do futebol.