Como nasce uma camisa oficial de futebol que não existe


Em algum momento de minha vida, fui com minha mãe à região da Rua 25 de Março, um epicentro do comércio popular em São Paulo. Entrando em lojas e revirando produtos, encontrei uma camisa de futebol que me chamou a atenção.

Era uma camisa do Club Deportivo Águila, de El Salvador, que se mostrava rica em determinados detalhes e pobre em outros. O escudo era bem bordado e o nome do clube aparecia na gola pólo; ao mesmo tempo, não tinha números ou patrocinadores, e mesmo as faixas verticais em preto e laranja apresentavam falhas.

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Valia o investimento, especialmente porque o preço era bem camarada.

Essa camisa do CD Águila ficou perdida em gavetas por alguns anos, eventualmente me acompanhando em jogos de futebol com os amigos. Até que, anos depois, veio uma ideia.

Como seria deixar essa camisa, feita com algum capricho, com cara de original?

Fabricando uma camisa

O primeiro passo para deixar a camisa com cara de original foi meio óbvio: constatar que o clube existe. E sim, o Águila existe. Fundado em 1926, iniciou uma ascensão na década de 1950 e se tornou um dos maiores vencedores da primeira divisão salvadorenha, disputando títulos locais com rivais como FAS, Alianza, Luis Ángel Firpo e Isidro Metapán.

O segundo passo: verificar se a camisa existe. E a única pista era a etiqueta por dentro da gola, com a marca Megga Sports. É difícil achar informações sobre a empresa – uma busca no Google apenas exibe outras camisas de futebol falsificadas nos mesmo moldes, caprichando em detalhes e abrindo mão de marcas de patrocinadores.

Mas é possível constatar que a Megga Sports jamais foi uma fornecedora de material esportiva do clube – que já vestiu marcas como Nike, Umbro, Joma e Diadora, e também fabricantes locais, como Galaxia, Aviva e Maca. Entre todas as imagens de camisas do clube em sites especializados, nenhum batia com o modelo em mãos.

Assim, a primeira intervenção na camisa foi escolher a marca de uma fabricante. Escolhi – sem motivo especial – uma fornecedora que já vestiu o clube. Entrei em contato com uma empresa de bordados, enviei a camisa e a imagem da marca… Em poucos dias, recebi a peça “atualizada” com a marca bordada no peito.

Não ficou impecável, mas já deixou a camisa com uma cara “oficial”.

(Imagem: Emanuel Colombari)
A marca foi borrada de propósito (Imagem: Emanuel Colombari)

Patrocinadores

Com esta nova versão em mãos, era a hora de avançar. Hora de incluir estampas de patrocinadores e numeração.

A questão da numeração foi simples: bastou escolher um número e procurar uma fonte que foi utilizada pela marca bordada. O período escolhido foi a temporada 2009.

Para a escolha dos patrocinadores, a tarefa não foi tão simples. Em buscas na rede mundial de computadores, é possível ver camisas com o patrocínio da cerveja Brahva, a versão centro-americana da Brahma. Aí, por mais que o patrocinador estivesse tecnicamente correto, pareceria errado. Descartado.

Para deixar menos formal, a escolha foi por dois patrocinadores. Na frente, entrou a Tigo, marca com a qual a companhia telefônica luxemburguesa Millicom opera em diversos países da América Latina. Nas costas, a Pepsi.

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Com as marcas e a numeração definidas, estabelecemos um contato com uma estamparia especializada em uniformes esportivos. O serviço, por sinal, é bastante recomendado para quem coleciona camisas e quer recuperar peças danificadas – estampas de escudos desgastadas ou patrocínios caídos, por exemplo.

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Imagens enviadas, orçamento feito, camisas enviadas… Algumas semanas depois, a empresa devolveu a nova camisa do Club Deportivo Águila, agora com cara de original. O patrocínio frontal ficou pesado e as cores não combinaram tanto, mas as costas deixaram uma imagem positiva.

O resultado final, depois de um processo (sem pressa) de uns cinco meses, você confere nas fotos.

Ficou perfeita? Não, é claro que não. Mas quem olhar a camisa na rua durante um passeio certamente vai se surpreender com a raridade – a menos, é claro, que o local para o passeio seja El Salvador.

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