‘Daniel Alves do futebol’ é o mesmo que está preso pelo estupro de uma mulher


A modalidade “pedir desculpas após falar ou fazer alguma coisa polêmica” se torna cada vez mais presente no futebol. Yan Couto fez sua estreia nesta categoria ao pedir desculpas pelo que disse na última segunda-feira (16), quando elegeu Daniel Alves seu maior ídolo no futebol. No entanto, como a maioria das cartas de perdão dos boleiros, o lateral-direito da Seleção Brasileira ressaltou que foi mal interpretado. 

– Quando eu me referi a Daniel Alves como um ídolo, foi no sentido do futebol, coisa que acreditei ter deixado claro, mas pelo nervosismo pela minha estreia na Seleção e por ter tido a oportunidade de jogar ao lado de tantos jogadores incríveis, errei profundamente ao não especificar e deixar livre para a interpretação de cada um – disse o jogador em nota oficial.

“Deixar livre para a interpretação de cada um”. É aqui que está o pulo do gato. A fala de Yan deixou muito clara a admiração dele pelo ex-lateral da Seleção para além das quatro linhas.

– Meu ídolo é o Daniel Alves, não tem como ser outro, cresci assistindo a ele pela TV, é um ídolo para muita gente, fez uma história linda na Seleção, pelos clubes que passou. É uma referência, até pelo estilo de jogo, a altura. É uma referência também defensivamente, acho que posso ser mais agressivo e mais completo.

Não existe dupla interpretação, porque não existem dois “Danieis”. O jogador Daniel Alves é o mesmo homem que está preso na Espanha pelo estupro de uma mulher. A cultura do futebol tenta de todas as formas pregar essa máxima, de que o atleta precisa ser separado da pessoa, mas só quando lhe convém. Não é e não pode ser assim.

“Não é só futebol” também quando as coisas vão mal

Quantas vezes você já ouviu a frase “não é só futebol”? Normalmente, essa sentença vem acompanhada de momentos icônicos, cenas bonitas e emocionantes. Por outro lado, quando o assunto é a violência de gênero ou as diversas formas de preconceito, o pedido costuma ser para que o público “separe as coisas”.

Esse é um grande erro. Futebol não é só futebol também quando as coisas vão mal ou quando o assunto é dolorido. O esporte é uma parte importantíssima da sociedade e jogadores não são apenas jogadores, eles são figuras a serem admiradas ou não. 

Desde muito cedo, esses atletas são formados com os requintes da cartilha machista e esse show de horror, com casos de estupro e violência contra a mulher, infelizmente, também faz parte do futebol. Por isso é preciso falar sobre o problema – gritar se for preciso – para combatê-lo.

No fim das contas, Daniel Alves é só uma representação de todo um sistema opressor. Recentemente, Cuca foi abraçado pelos jogadores do Corinthians apesar dos protestos contra sua contratação, e Antony foi reintegrado ao Manchester United mesmo respondendo judicialmente a uma acusação de violência doméstica… São muitos os exemplos negativos que machucam as mulheres apaixonadas por esse esporte.

Não há mais espaço e nem desculpas para tentar separar o atleta do abusador.

Dois casos de estupro acontecem por minuto no Brasil

O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) estima que ocorram 822 mil casos de estupro no Brasil por ano. Desse total, apenas 8,5% deles chegam ao conhecimento da polícia e 4,2% são identificados pelo sistema de saúde. Esses números representam cerca de dois casos de estupro por minuto no país. 

Os dados apontam que mais de 80% das vítimas são mulheres. Em relação aos agressores, em termos de gênero, a maioria é composta por homens, com destaque para quatro grupos principais: parceiros e ex-parceiros, familiares (sem incluir as relações entre parceiros), amigos/conhecidos e desconhecidos. 

A análise do Instituto abrange dados da Pesquisa Nacional da Saúde (PNS/IBGE) e do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan/Ministério da Saúde). 

Se você é mulher e sofreu violência sexual ou conhece alguma mulher em situação de risco, ligue 180. O serviço de enfrentamento à violência contra a mulher é responsável por receber denúncias de violações contra as mulheres e encaminhar o conteúdo dos relatos aos órgãos competentes e monitorar o andamento dos processos.


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