É preciso ser antirracista: Corinthians promove oficinas com jovens das categorias de base


O vestiário da Fazendinha estava cheio na tarde do último dia 8, uma quarta-feira. Mais de 30 garotos entre 13 e 14 anos se aglomeravam em um canto do espaço, todos de uniforme do Corinthians e calçando chuteiras. Porém, o treino só começaria 1h30 mais tarde.

Antes de irem a campo, os jogadores da base do Corinthians tiveram uma aula, mas não de tática ou fundamentos de futebol. Eles participaram de uma oficina antirracista.

Jogadores da base do Corinthians participam de oficina antirracista — Foto: Bruno Cassucci

Jogadores da base do Corinthians participam de oficina antirracista — Foto: Bruno Cassucci

A iniciativa partiu do Núcleo Educacional Social-Psicológico (NESP) do Corinthians, que aceitou projeto oferecido por Danilo Pássaro, historiador e torcedor apaixonado pelo clube.

– Entendo o futebol como um instrumento de transformação social, que tem impacto gigantesco no imaginário e nas identidades do povo brasileiro – explicou o ativista antirracismo.

– Estava vendo esses casos de racismo e fiquei pensando: os jogadores não se posicionam. Todo mundo falava: “Pô, jogador de futebol brasileiro é tudo ignorante, não se posiciona sobre pauta alguma.” Eu disse: isso não é responsabilidade do jogador. Muitos não têm dinheiro para condução, não têm formação, família estruturada, acesso a boa escola. Quando ele realiza o sonho de ser jogador, ele só quer viver o sonho dele, dar uma casa para mãe, comprar um carro.

– A gente fica esperando do sujeito uma coisa que a sociedade nunca ofereceu para ele. Para mim, essa responsabilidade dos clubes, pegar os atletas desde a base e formá-los sobre tudo, sobre as pautas contemporâneas. Não é admissível ter jogador racista ou que assedia e estupra mulheres – opinou Danilo Pássaro.

Filho de Fagner faz gol de falta em Dérbi pelo sub-13 do Corinthians

Filho de Fagner faz gol de falta em Dérbi pelo sub-13 do Corinthians

As oficinas começaram há pouco mais de um mês e já receberam três categorias diferentes. Em cada uma delas o professor utilizou abordagens diferentes, de acordo com a idade dos jogadores.

Na oficina acompanhada pelo ge, Danilo Pássaro exibiu um trecho do podcast “Mano a Mano” em que o rapper Mano Brown entrevista Ronaldo Fenômeno. A partir de algumas falas do ex-jogador, o professor debateu questões de raça, a história da escravidão no Brasil e o conceito de racismo estrutural.

Dentre os interessados alunos estavam os filhos do zagueiro Gil e do lateral Fagner (veja acima gol do garoto contra o Palmeiras), que jogam na base alvinegra.

– É muito importante esse debate, ainda não somos tão maduros para saber as coisas, mas é uma base para a gente. Serve para a vida inteira – comentou Kauê Buratti, que tem 13 anos e joga como meio-campista.

Em diversos momentos, os garotos interagiram com Danilo. Um relembrou um caso de racismo presenciado, outro contou do que aprendeu nas aulas de História, e não faltaram perguntas embaraçosas para o professor:

– Se os políticos são quase todos brancos, como esperar que eles mudem as leis a favor dos pretos? – indagou um dos jovens atletas.

Jogadores do sub-12 do Corinthians em oficina antirracista — Foto: Divulgação

Jogadores do sub-12 do Corinthians em oficina antirracista — Foto: Divulgação

Além do combate ao racismo, o NESP periodicamente aborda outras questões extracampo com os garotos, como machismo, xenofobia, dependência química, entre outros temas.

– A gente acredita que estamos contribuindo nessa formação, envolvendo as famílias, e pensando em um cidadão crítico – explicou a assistente social Regiane Cristina Ferreira.

– Os jogadores gostam muito. Conforme eles vão crescendo, a gente vai percebendo essa maturidade. Dois anos atrás, os atletas do sub-20 até se posicionaram numa questão que envolvia o combate à violência contra a mulher – completou a profissional, que está há 17 anos no Corinthians e compõe o NESP com a psicóloga Dominique Gonçalves e a orientadora educacional Rebeca Peridis.

A oficina com os garotos do sub-13 fluiu tão bem, que por pouco não atrasou o treino daquele dia. Antes de se despedir dos alunos, Danilo Pássaro ensinou uma frase para a turma, repetida em alto e bom som:

– Não basta não ser racista. É preciso ser antirracista!

+ Assista: tudo sobre o Corinthians na Globo, sportv e ge


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