Por mais de 40 anos, as brasileiras foram proibidas de jogar futebol. Em 1941, o então presidente Getúlio Vargas assinou um decreto-lei que tirava das mulheres o direito de praticar a modalidade mais popular no país. O esporte de contato era considerado “incompatível com a natureza” feminina, e os riscos de impactos que poderiam torná-las estéreis também serviam como argumento. Nenhuma das falácias, porém, tirou os pés e a cabeça de dona Dirce da bola.
Em 1983, o Conselho Nacional de Desportos (CND), repartição subordinada ao Ministério da Educação, considerou o futebol feminino aceitável e o regulamentou. Foi aí que a coordenadora Dirce Figueiredo entrou em campo. Presidente da Federação Mineira de Futebol Amador na década de 1980, ela foi uma das responsáveis pela criação dos primeiros torneios femininos no Estado. Dirce ajudou a criar o primeiro estadual feminino, em 1983, para definir o representante de Minas na antiga Taça Brasil. O Atlético foi o campeão na ocasião. De forma efetiva e sem interrupções, porém, o Estadual só passaria a ser disputado de forma regular a partir de 2005.
“Foram jogos espetaculares, uma atração para o público na época. Era realmente uma novidade (na década de 1980). O futebol feminino, assim como outros esportes, era proibido para as mulheres. A Fifa abriu mão dessa discriminação e recomendou, por meio de uma circular, a criação dessa modalidade às confederações. Assim que veio essa recomendação, as confederações começaram a criar os departamentos de futebol feminino. Aqui na Federação Mineira, não tinha um departamento como tinha o futebol masculino, então quem dirigia e organizava os campeonatos era eu mesma (risos), com ajuda de outros que estavam no meio do futebol”, relembrou Dirce, hoje com 81 anos.
Os caminhos abertos por dona Dirce, há cerca de 40 anos são o que motivam e encorajam as atuais gerações a seguirem no esporte. Ao longo das últimas décadas, os clubes começaram a ter o departamento feminino – em alguns momentos, por uma determinação das entidades nacionais e continentais.
A partir de 2019, a Conmebol tornou obrigatório que participantes da Libertadores tivessem uma equipe feminina. A manutenção desses times resultou em um crescimento técnico. Na próxima temporada, o Estado terá, pela primeira vez na história do futebol feminino, seus três principais clubes, Cruzeiro, Atlético e América, na elite do Brasileirão feminino, sendo o acesso mais recente o do Coelho, que subiu neste ano de 2023.
No último Brasileiro, o Cruzeiro foi a primeira equipe mineira a avançar à fase eliminatória, disputando as quartas de final contra o Corinthians. O time da capital paulista seguiu no campeonato, sagrou-se campeão diante da também poderosa Ferroviária, de Araraquara, em jogo que comprovou a força do futebol feminino no Brasil — 42.556 pessoas pagaram ingresso para ver a final, vencida pelo Timão por 2 a 1, na Neo Química Arena, em São Paulo, neste mês de setembro. Um recorde nacional da modalidade que vive, a cada dia, seu momento mais especial.