Inovação redefine comércio e gera novas oportunidades e profissões


Bruno Vital
Repórter

O comércio de bens, serviços e o turismo em Natal está passando por uma transformação que já começa a impactar a forma como as empresas se relacionam com os clientes e, principalmente, a maneira como o mercado de trabalho se adapta a essas mudanças. O uso de tecnologias como inteligência artificial, big data e automação está não só redefinindo a dinâmica da economia local, mas também abrindo caminho para o surgimento de novas profissões e oportunidades. Na capital, alguns negócios já adotam ferramentas que geram um aumento de até 30% na produtividade.

Especialistas ouvidos pela reportagem da TRIBUNA DO NORTE são unânimes em afirmar que o futuro do mercado de trabalho e a competitividade das empresas, na capital e no Rio Grande do Norte, dependem diretamente das mudanças que estão acontecendo agora. Reconhecido como polo turístico e motor da transição energética mundial, o Estado tem a chance de ser um protagonista da transformação digital para geração de riqueza, qualificação da população, fortalecimento da cadeia produtiva e fomento do desenvolvimento econômico.

Marcelo Queiroz, presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado (Fecomércio-RN), observa que a novidade não é apenas uma ferramenta de melhoria, mas um elemento para assegurar a sobrevivência das empresas em um mercado em constante evolução. “O uso de ferramentas digitais está transformando a forma como empresas interagem com clientes e gerenciam operações, criando novas oportunidades e aumentando a competitividade. No turismo, a tecnologia tem o potencial de aprimorar a experiência dos visitantes e otimizar a gestão de recursos”, afirma.

Para Raniery Pimenta, diretor regional do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac-RN), a revolução proporcionada pela tecnologia abre portas para o surgimento de novas possibilidades. A análise de dados permite entender melhor os comportamentos dos consumidores, possibilitando que empresas criem estratégias de venda mais eficazes. “Na área do turismo, por exemplo, a utilização dessas informações permite encontrar as melhores opções de oferta para os hóspedes, construindo pacotes turísticos personalizados”, explica Pimenta.

Alberto Kastro, especialista em IA e fundador de uma escola de formação em tecnologia, ressalta que a aplicação da inteligência artificial já deixou de ser uma exclusividade das grandes corporações. “As micro e pequenas que não acompanharem também ficarão para trás. A IA também ajuda a entender os dados da empresa. Muitas vezes, o empresário não sabe que detém informações valiosas dentro de sua própria base de dados, como as conversas no WhatsApp. É possível analisar essas informações com IA para repensar o modelo de negócio e identificar quais produtos têm mais demanda, por exemplo”, pontua.

Galeteria reabre com proposta inovadora

Algumas empresas da capital já apresentam resultados significativos no uso da tecnologia. É o caso de uma galeteria tradicional da década de 1970, que reabriu em Natal, no bairro de Lagoa Nova, com uma proposta inovadora que alia o sabor clássico a padrões modernos em termos de gestão e operações.

Thiago Haddad, sócio da galeteria, detalha que o restaurante vem usando Inteligência Artificial no processo de contratação de novos profissionais. A tecnologia também é utilizada em outras etapas do negócio, como na formatação do cardápio, reconstituição de pratos e elaboração de novas receitas.

“Inaugurei esse restaurante recentemente e como a gente precisou contratar muita gente, durante as entrevistas dos futuros colaboradores, eu pedi que a IA me auxiliasse, escutasse as conversas e me traçasse um perfil entre comunicador, analista, executor ou planejador. Isso faz com que a gente desenvolva as políticas e práticas mais eficazes internamente e o ambiente acaba ficando mais inclusivo e mais produtivo também. Estamos usando muito essa parte de IA até para sugerir novas receitas, formas de montar novos pratos”, diz Thiago Haddad.

O empreendedor, que também integra a diretoria da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-RN), defende que o uso responsável da IA pode contribuir também para enriquecer a experiência do cliente. “Acho que a IA cabe em algumas coisas e acho que não cabe em outras, mas o ser humano que não souber lidar será substituído. No fim das contas, acho que esse está sendo um diferencial nosso, de fazer um paralelo legal entre tradição e inovação, modernizando, mas mantendo a essência lá do passado, no mesmo lugar, com o mesmo tempero”, completa.

Outro negócio potiguar que já instituiu novas tecnologias na política interna e colhe resultados práticos é a empresa de purificadores de água comandada pelo empresário Ricardo Pontes. Utilizando IA para análises de dados financeiros, atendimento ao cliente via WhatsApp, melhoria na assistência técnica, Pontes diz que a produtividade registrou aumento de 30%, em comparação ao período em que não havia uso das ferramentas tecnológicas. Além disso, a empresa paga bônus para colaboradores que apresentem novas ideias de projetos baseadas em tecnologia.

“Já tem muito exemplo prático, de leitura de demonstrativos financeiros através de IA, atendimento no WhatsApp, controladoria através da IA, são coisas que já estão acontecendo, mas eu diria que a gente ainda está no começo porque temos espaço para expandir. A necessidade da mão de obra não deixa de existir, a empresa não encolheu, e não fizemos demissão em massa por conta de uso de tecnologia. Realocamos as pessoas para que elas aprendam e possam administrar essas tecnologias”, destaca.

Galeteria tradicional, reaberta em Natal, está usando a Inteligência Artificial no processo de contratação de novos profissionais | Foto: Magnus Nascimento

Novas tecnologias exigem profissionais especializados

A mudança tecnológica não só impacta a forma como as empresas conduzem seus negócios, mas também cria uma série de novas oportunidades. Em um mercado cada vez mais conectado, surge a necessidade de profissionais especializados em áreas que, há poucos anos, eram pouco exploradas. O especialista em tecnologia, inovação e cultura digital, Diogo Cortiz, destaca que a tecnologia está impactando tarefas específicas dentro de cada profissão e alerta que os profissionais devem estar atentos, uma vez que muitos dos impactos ainda são desconhecidos.

“Estamos em um momento de transição para entender qual será o verdadeiro impacto no mercado. Há um estudo do FMI que aponta que 40% dos postos de trabalho no mundo hoje estão expostos à IA. Isso não significa que metade deles será eliminada, mas que eles podem se beneficiar muito do uso da IA. No Brasil, temos uma vantagem por estarmos no sul global, a primeira onda de automação tende a ocorrer nos países mais ricos, onde a mão de obra é mais cara. Isso nos dá tempo para entender o que acontece lá fora e nos adequarmos”, explica Diogo Cortiz.

Alberto Kastro diz que dominar a IA será um divisor de águas para a competitividade no cenário atual. Ele antecipa que cargos como “diretor de gerenciamento de IA” se tornarão mais frequentes, marcando uma nova era na gestão empresarial. “Em uma empresa com 40 franquias, por exemplo, são mais de 20 ferramentas de IA. Isso é gerido por uma área nova e agora vai surgir um novo cargo – o diretor de gerenciamento de IA. Assim, o gerente também será treinado pelo gestor. Precisamos acompanhar porque talvez a profissão do futuro ainda nem tenha sido criada”, complementa.

Pesquisa

A pesquisa “Future of Jobs Report” do World Economic Forum destaca que as profissões do futuro serão impulsionadas pela tecnologia digital e transição para a economia verde. O estudo indica que as profissões que se relacionam com IA, aprendizado de máquina, sustentabilidade, inteligência de negócios, segurança da informação, sistemas de energias renováveis, análise de big data, robótica, blockchain, e-commerce, marketing digital e estratégia estarão em alta até 2027.

Raniery Pimenta complementa ao afirmar que mais importante do que se preocupar com profissões específicas é desenvolver competências essenciais para o novo cenário do mercado de trabalho. “Faz mais sentido falar sobre competências, e a principal delas atualmente é a adaptabilidade – a capacidade de recalcular rotas, repensar o presente e construir o futuro. Essa adaptabilidade deve ser a principal aposta para quem deseja ser competitivo no mundo empresarial”, frisa o diretor regional do Senac-RN.


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