A partir deste mês, uma nova regulamentação envolvendo o mercado de agentes de jogadores de futebol passa a vigorar mundialmente. As novas regras foram aprovadas pela Fifa (Federação Internacional de Futebol) no fim do ano passado e têm como objetivo aumentar a transparência no bilionário mercado de compra e venda de atletas.
A mais importante, e polêmica, diz respeito à comissão recebida pelos agentes em cada transação, que passa a ter um teto imposto pela autoridade máxima do futebol.
Se o agente representa o clube que está comprando ou o jogador que está sendo comprado, a comissão passa a ser limitada a 3%, tendo como base o salário do jogador, naqueles casos em que a remuneração anual ultrapassa US$ 200 mil (cerca de R$ 1 milhão). “Quase nenhum negócio sai com uma taxa de comissão de 3%”, afirma Rodrigo Marrubia, sócio do escritório Carlezzo Advogados e especialista em direito desportivo.
Não existia, até agora, nenhuma limitação às comissões, havendo casos em que as taxas recebidas pelos agentes chegavam a 50%, diz Marrubia. “A decisão da Fifa é para acabar com essa farra, mas considero que os percentuais escolhidos são muito baixos.”
Se o salário for igual ou abaixo de US$ 200 mil por ano, a comissão poderá chegar a até 5%. Se o agente atua pelo lado do clube vendedor, a taxa estabelecida pela Fifa é de 10% sobre o valor da transação.
As novas regras valem para todas as transações internacionais envolvendo jogadores ou técnicos.
No início de setembro, no entanto, a entidade que regula o futebol soltou um comunicado em seu site no qual informou que uma decisão em caráter liminar de um tribunal de Dortmund, na Alemanha, proibiu a imposição das novas regras para os agentes de jogadores.
Enquanto aguarda uma sentença definitiva, a Fifa informou que as regras para os agentes não serão válidas no território alemão. Por enquanto não valem também nas situações que envolvem jogadores ou técnicos da Alemanha, mesmo que atuando em outras regiões.
Segundo Marrubia, a brecha pode incentivar que os agentes façam negócios envolvendo clubes do Campeonato Alemão, uma vez que não haverá o teto para as comissões. “Um grande empresário me disse que vai começar a olhar com mais carinho para o mercado alemão.”
Advogado da área de esportes e entretenimento do CSMV Advogados, Pedro Henrique Mendonça acrescenta que o caso ainda poderá ser levado à análise pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, cuja decisão teria efeitos estendidos a todos os países que integram o bloco.
“Assim, não é possível descartar que o processo judicial em trâmite na Alemanha venha a impactar a aplicação do regulamento também em outras jurisdições”, diz Mendonça.
A Fifa disse que a decisão liminar de Dortmund é inconsistente com decisões anteriores em outros países europeus, incluída a própria Alemanha. “A regulação fornece uma solução razoável para ajudar a resolver as falhas sistêmicas no mercado de transferências de jogadores”, afirmou a entidade.
No último dia 27, foi a vez de a FA, a federação inglesa de futebol, informar que também vai postergar a implementação das novas regras da Fifa até que uma corte arbitral aponte um veredicto a respeito. A decisão da corte arbitral inglesa deve sair até 30 de novembro.
A expectativa é que a Fifa siga a mesma linha do que fez em relação à Alemanha e também exclua a Inglaterra das regras até que haja uma decisão definitiva da corte local.
“Se saírem decisões definitivas que vão contra a regulação, será um golpe para a Fifa na pretensão de implementar a nova regulamentação de agentes, e provavelmente ela teria que rever todo o processo”, diz Marrubia.
Entre as demais regras estabelecidas no novo regulamento, destaca-se também a proibição da representação múltipla, em que o agente atua nas três pontas do negócio —representa o jogador, o clube vendedor e o comprador.
A partir de agora, o mesmo agente poderá representar somente o jogador ou o técnico e o clube responsável pela contratação, mas não mais também o vendedor.
A Fifa também passou a exigir que os agentes que intermedeiam negociações internacionais da bola façam uma prova para obter uma licença que lhes concederá a permissão para realizar efetivamente tais transações. Antes, a licença era concedida pelas próprias confederações locais, com regras específicas a depender da região.
Na primeira prova aplicada, em que são cobrados conhecimentos a respeito da regulação do esporte em testes de múltipla escolha, menos da metade dos agentes brasileiros acertou 75% das questões, percentual mínimo necessário para a aprovação. Os aprovados têm ainda de pagar uma taxa anual de US$ 600 (cerca de R$ 3.000) para manter a licença regularizada.
Mendonça, do CSMV, diz que a Fifa busca com a regulamentação estabelecer padrões éticos mínimos, proteger jogadores e prevenir práticas abusivas.
“É importante ter em conta que a edição do novo regulamento de agentes se insere no contexto de uma reforma mais ampla que vem sendo realizada”, afirma Mendonça. Nessa reforma, a Fifa pretende que o dinheiro gerado pelo futebol permaneça dentro do sistema e primordialmente nos clubes.
“As mudanças trazem grandes desafios ao mercado e, em tese, trazem aspectos positivos e negativos aos agentes. Uma avaliação mais precisa sobre os seus efeitos dependerá diretamente da sua implementação prática”, diz o advogado do CSMV.