A mudança na política de checagem de fatos anunciada pela Meta teve motivação política, na avaliação de Jesper Rhode, sócio da consultoria Tr4nsform.com, que participou da feira de tecnologia CES. “A integração de inteligência artificial pela Meta em suas plataformas, capaz de analisar e possivelmente monitorar conversas entre 3 bilhões de usuários, evidencia a escala do seu poder”, disse.
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Para o especialista, o anúncio da companhia evidencia questões urgentes sobre o futuro da liberdade de expressão, a influência corporativa e o equilíbrio entre inovação e responsabilidade.
O que motivou a mudança na política da Meta?
A decisão da Meta de substituir seu programa de verificação de fatos por terceiros pelo sistema Notas de Comunidade, guiado pelos próprios usuários, marca mudança estratégica significativa. Isso reflete tendência crescente entre grandes empresas de tecnologia dos EUA de se alinharem mais estreitamente com o governo Trump, provavelmente como forma de navegar no cenário político e favorecer um ambiente regulatório mais propício aos seus interesses.
Mas como esse favorecimento pode ocorrer?
Esse realinhamento destaca a relação cada vez mais interligada entre corporações e governos ao redor do mundo. Em países como China e Rússia, as empresas frequentemente atuam como extensões da influência estatal, amplificando o alcance global de suas nações.
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Estaria emergindo dinâmica semelhante nos EUA, onde gigantes como a Meta possuem influência que rivaliza com a de governos? Essa parceria levanta questões sobre o potencial de corporações e Estados combinarem recursos, criando concentração de poder sem precedentes.
A integração de inteligência artificial pela Meta em suas plataformas, capaz de analisar e possivelmente monitorar conversas entre seus 3 bilhões de usuários, evidencia a escala do seu poder. Essas empresas operam em escala global, com impacto e alcance que superam o de muitos países, permitindo-lhes moldar narrativas políticas e normas sociais.
Ao se posicionar como ator central no cenário político dos EUA, a Meta parece adotar estratégias similares às de Estados autoritários, confundindo os limites entre autonomia corporativa e influência estatal.
Mas essa mudança pode levar a algum tipo de aumento dos discursos de ódio?
Esses acontecimentos levantam questões urgentes sobre o futuro da liberdade de expressão, da influência corporativa e do equilíbrio delicado entre inovação e responsabilidade em um mundo cada vez mais interconectado.
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Essa mudança não se resume à censura ou ao controle. Ela decorre da necessidade de lidar com consequências não intencionais de algoritmos baseados na atenção, que prosperam com o sensacionalismo e a polarização.
Ao amplificar conteúdos divisivos, esses algoritmos exigem moderação para manter discurso equilibrado. No entanto, a decisão da Meta de se afastar da verificação de fatos independente levanta preocupações sobre como o ‘equilíbrio’ do discurso será definido e por quem.
A democratização das vozes em plataformas como Facebook reformulou o discurso público, dando palco a indivíduos comuns, mas ampliando a influência de atores poderosos.
Qual será o desafio agora para a sociedade e os usuários?
O desafio para a sociedade será navegar por esse cenário enquanto protege princípios de transparência, justiça e liberdade que sustentam o discurso democrático. A comunidade global enfrenta a realidade de que a maior plataforma para a troca de ideias no mundo opera sob o comando de uma empresa cujo CEO se comprometeu publicamente a acomodar os interesses do governo dos EUA.
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À medida que as empresas de tecnologia aprofundam seus laços com os Estados, resta saber se isso servirá ao interesse público ou consolidará o poder de formas que o prejudicam.
Outras empresas podem seguir a decisão da Meta?
Nos Estados Unidos, a maioria das big techs está apoiando o novo governo, e um ato de apoio do Facebook provavelmente não será percebido de maneira tão negativa neste mercado. Os Estados Unidos são um mercado com nível de regulação muito mais baixo que Europa e no Brasil, onde a empresa comunicou que vai manter o conceito atual pelo menos por enquanto.
* O jornalista viajou para cobrir a CES a convite da Samsung