Você, provavelmente, não conhece um jogador de destaque que seja haitiano. O país caribenho, marcado por uma longa guerra civil, não tem estrutura para revelar talentos nem tradição de grandes jogadores. Está fora do circuito internacional da bola. E um menino do Haiti que tenha o sonho de se transformar num atleta internacional de alto nível precisa ser obstinado. Este é o caso de Ricardo Adé, zagueiro e destaque da LDU, finalista da CONMEBOL Sul-Americana 2023 contra o Fortaleza neste sábado (28), às 17h (de Brasília), com transmissão ao vivo pela ESPN no Star+.
Ricardo se encantou pelo futebol aos 6 anos e decidiu ser jogador. Os pais exigiram que ele não deixasse a escola, mas também eram apaixonados pelo esporte e o apoiaram. Ainda muito jovem, se destacou pela equipe amadora local chamada Baltimore e recebeu um convite para atuar na Tailândia.
Adé juntou o que podia de recursos junto aos familiares e embarcou numa aventura do outro lado do mundo. Ao chegar, não havia quem o recebesse. Abandonado, perambulou pela cidade por três meses batendo na porta dos clubes para tentar uma chance. Nada. Mas ele não desistiu.
Voltou e começou a jogar no Dom Bosco, um time local. Foi, então, indicado para o Miami United, da NPSL, quarta liga em importância nos Estados Unidos. De lá, foi para o futebol chileno e sua carreira começou, enfim, a ganhar rumo. Através do Santiago Morning, da segunda divisão, assinou seu primeiro contrato profissional já com 26 anos.
Mudou-se para o Magallanes e recebeu uma proposta de um time da primeira divisão equatoriana, o Mushuc Runa. Não pensou duas vezes e foi jogar na altitude de Ambato. No ano seguinte, estava no Aucas e virou um dos pilares do time campeão equatoriano de 2022. Quando levantou a taça junto a seus companheiros, já tinha acertado com um dos maiores clubes do país, a LDU.
Aos 33 anos, Adé viverá neste sábado contra o Fortaleza, no Uruguai, o auge do seu conto de fadas. Está numa final continental na condição de um dos líderes do grupo. O zagueiro de 1,90m é referência técnica do time e se destaca no jogo aéreo.
Há dois anos, ele não vê a família. Com medo de sequestro, sua irmã o orienta a não viajar a seu país natal, que atravessa um momento de muita tensão entre gangues.
Vive sozinho em Quito e diz que assim pode se concentrar na carreira, seu foco máximo. Cozinha a sua própria comida e gosta de ficar em casa, de onde se comunica pela internet com o filho, que mora nos Estados Unidos. No clube, é tido como bem humorado e muito profissional.
Torcedor do Real Madrid, Ricardo tem em Sergio Ramos seu ídolo no futebol, mas fala com orgulho do amistoso que disputou com a seleção de seu país na Bombonera, em Buenos Aires, quando marcou Lionel Messi.
Ele ainda sonha em atuar no famoso futebol europeu. Fã do filme Pantera Negra, Adé adotou um visual semelhante ao do personagem cinematográfico e assim brilha nos gramados do Equador e de toda a América do Sul. É, sem dúvida, um herói do futebol.