No dia 10 de agosto de 2023, legisladores da Califórnia decidiram permitir que duas empresas que já operavam pequenas frotas de robotáxis fora dos horários de pico em São Francisco expandissem seus serviços. A decisão provocou muita controvérsia, especialmente pelo receio de que a automação pudesse gerar caos no trânsito – como já havia acontecido em algumas ocasiões na cidade. Mas para Tekedra Mawakana, co-CEO da Waymo, foi um momento de validação. “Conseguimos. Mal posso esperar para que mais pessoas experimentem os benefícios da autonomia total”, disse em nota.
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Tekedra, de 49 anos, é uma das poucas mulheres na liderança de um movimento que pretende revolucionar a indústria automobilística. “A tecnologia driverless tem o potencial de deixar as ruas mais seguras, mas está bastante imatura, e a maioria das pessoas não a conhecem bem. Por isso, acho importante sermos honestos e dizermos que ainda há muito a aprender nesse campo”, disse a CEO, em entrevista à Forbes em 2019, quando ainda era COO (chefe de operações) da companhia, hoje avaliada em mais de US$ 30 bilhões.
“Ao longo da história, a indústria transformou potência, aceleração e resistência em elementos fundamentais de atratividade na venda de automóveis”, diz Sergio Avelleda, coordenador do Núcleo de Mobilidade Urbana do Insper e ex-secretário de Mobilidade Urbana da Cidade de São Paulo. “Velocidade se tornou sinônimo de sucesso, arrojo e competência. O carro é um exercício de poder. Os autônomos chegam para mudar abruptamente essa relação, promovendo um uso mais racional do automóvel.” A própria Tekedra já declarou que o objetivo da Waymo é tornar as viagens de carro “incrivelmente entediantes”. “O trajeto não é muito emocionante – e não queremos que seja”, disse ela à Business Insider em 2019.
Estudos apontam que tirar o humano do volante tem o potencial de praticamente zerar os acidentes, que hoje causam 1,3 milhão de mortes ao ano no mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, são 88 pessoas por dia que perdem a vida em acidentes de trânsito, de acordo com o Observatório Nacional da Segurança Viária (ONSV).
O propósito de tornar o trânsito mais seguro tornou-se um compromisso de Tekedra por motivos profissionais, e também pessoais. Em um evento da Universidade de Berkeley, em março último, a executiva contou que dois tios seus morreram em acidentes de trânsito “completamente evitáveis”. “Então eu tenho uma ligação profunda com essa missão. E isso é muito diferente de lançar o software da moda.” Outro fator que a atraiu foi a disrupção. A executiva, que foi nomeada co-CEO em 2021, ao lado de Dmitri Dolgov, diz adorar a “ambiguidade” de um setor em que nada está definido. “O ambiente regulatório não está consolidado e a tecnologia não está pronta”, disse, em entrevista ao site do CES 2023. “Mas não dá para fazer uma omelete sem quebrar os ovos.”
O fato é que, nas semanas que se seguiram ao sinal verde da Califórnia, alguns “ovos se quebraram”, causando forte reação dos agentes públicos. O aumento de incidentes nas vias fizeram com que Tekedra e os outros líderes do setor fossem criticados duramente. Depois de uma batida entre um robotáxi e um caminhão de bombeiros, a Cruise decidiu diminuir em 50% sua frota. Com os holofotes na concorrente, Tekedra e Dmitri prefeririam não se manifestar. Mas o procurador da cidade, David Chiu, apresentou moções solicitando a suspensão temporária da permissão para os robotáxis. As únicas declarações oficiais da Waymo vieram da porta-voz, Julia Ilina: “Vamos observar o status do recurso pendente e, enquanto isso, continuaremos a trabalhar com a cidade de São Francisco de forma construtiva”, disse ela ao site de notícias da região, Axious.
Por enquanto, a Waymo atua em São Francisco e Phoenix, no Arizona. Mas já anunciou que, ainda este ano, vai colocar seus carros autônomos nas ruas de Austin, no Texas. Los Angeles e Nova York estão na mira, mas apenas no longo prazo. “Muitos engenheiros veem os carros autônomos como o maior desafio existente na área de machine learning. São muitas camadas de complexidade. Por isso queremos entregar resultados aos poucos, cidade por cidade”, disse Tekedra ao Insider.
Conduzir empresas que precisam lidar com mitigação de riscos é uma das especialidades de Tekedra, que nasceu no estado do Mississipi e é doutora em Direito pela Columbia Law School. A executiva já havia passado por cargos de alta gestão no eBay, Yahoo e AOL antes de chegar à Waymo. Hoje, atua também em conselhos de administração de empresas como a Intuit. Ela ainda é investidora-anjo de projetos socialmente responsáveis e aconselha organizações voltadas a melhorias urbanas.
Em uma entrevista para Merline Saintil, de quem foi parceira na fundação da Black Women on Boards – uma comunidade que promove a presença de executivas negras em conselhos –, Tekedra disse que o desafio da Waymo é enorme, mas empolgante. “Dar vida a esse serviço me alimenta. É algo muito forte saber que estamos transformando a mobilidade nas cidades. E olha que estamos só no começo.”