Vasco e 777 Partners: entenda como são os negócios da empresa que administra a SAF do clube


The New York Times – As aquisições ocorreram tão rapidamente que foi difícil acompanhar. Um acordo para comprar o time de futebol mais antigo da Itália. Um investimento em um dos times mais populares do Brasil. Participações em clubes conhecidos na Bélgica e França, Alemanha e Austrália.

Cada novo negócio era alardeado pela empresa de investimentos 777 Partners, sediada em Miami, que os estava agarrando às pressas. Então, em setembro, o grupo de investimento revelou o seu maior negócio até agora: um acordo para adquirir o controle acionário do Everton FC, membro fundador da Premier League e um dos clubes de futebol mais antigos da Inglaterra.

De repente, todo mundo no futebol já tinha ouvido falar da 777 Partners. Além do nome, porém, pouco se sabia sobre a empresa. Ela dizia ter US$ 10 bilhões em ativos, mas era tão fechada que era difícil verificar essa afirmação. Processos contra a empresa causaram preocupações nos potenciais parceiros. Uma série de contas não pagas, algumas recentes até este mês, causaram outras.

RIO DE JANEIRO RJ ESPORTES 777 PARTNERS 17/03/2022 Representantes da 777 Partners, empresa que negocia com o Vasco a compra de 70% da SAF, chegaram ao Rio de Janeiro na manhã de hoje (17) e iniciaram reuniões com a cúpula do clube. Eles estiveram no CT Moacyr Barbosa, acompanhados de membros da diretoria cruz-maltina, e estão programadas visitas a outras sedes FOTO RAFAEL RIBEIRO VASCO DA GAMA  Foto: undefined / undefined

Agora, na disputa por uma vaga na Premier League, a 777 Partners enfrenta algo que havia evitado anteriormente: uma análise forense de suas participações, de suas finanças e de seu impetuoso coproprietário americano, Josh Wander, que em uma entrevista recente disse ser “mais sério em investimentos” no futebol do que qualquer outro na história.

A oferta da sua empresa pelo controle do Everton, uma aquisição que acabaria por exigir centenas de milhões de dólares em dívidas assumidas e outras obrigações, não é de forma alguma uma certeza. A Premier League, a Federação Inglesa de Futebol e um regulador independente do governo britânico, a Autoridade de Conduta Financeira, precisam aprovar o acordo proposto, um processo que provavelmente levará meses.

O que eles descobrirem pode ter implicações não apenas para o futuro do Everton, um gigante decadente e perdedor de dinheiro, mas também para o resto dos times com problemas financeiros na rede 777.

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Os riscos são igualmente elevados para a Premier League, que está tentando provar que pode supervisionar as finanças dos seus clubes, apesar das conversas sobre regulamentação governamental, e para uma economia do futebol global interligada, dependente da simples premissa de que os times podem e vão pagar as suas contas.

Nenhum dos órgãos públicos ou de futebol que estão avaliando a 777 Partners discutiu sua análise ou um cronograma para sua conclusão.

Wander, o cofundador e rosto público da empresa, recusou vários pedidos de entrevista para este artigo, embora tenha publicado uma longa carta aos torcedores no site do Everton, na qual reconheceu que eles ficaram desconcertados com as reportagens da mídia sobre os negócios da empresa. Mas essas reportagens, disse ele, eram “enganosas”. “A verdade é muito mais chata do que a ficção”, escreveu ele.

“Não somos destruidores de ativos nem investidores especulativos. Construímos e mantemos negócios e pretendemos manter os clubes de futebol em nosso portfólio por um longo prazo”, escreveu um porta-voz da 777 em comunicado enviado por e-mail. Na carta aos torcedores, Wander escreveu que compartilharia “recursos de recrutamento de jogadores, análise de dados e desenvolvimento comercial” com os demais times do grupo.

Mais de uma dezena de funcionários atuais ou ex-funcionários, dirigentes de clubes e outros que fizeram negócios com a 777, no entanto, revelaram novos detalhes e dúvidas sobre as fontes de seu financiamento. As pessoas pediram para não serem identificadas devido ao seu relacionamento com a empresa.

Everton FC tenta se levantar após temporadas brigando contra o rebaixamento no Campeonato Inglês sob administração da 777 partners  Foto: Nigel French/PA via AP

Nas entrevistas, eles também compartilharam detalhes sobre obrigações não cumpridas e contas não pagas, e questionaram se a empresa tem os recursos para gerir uma rede global de clubes com centenas de milhões de dólares em dívidas e obrigações.

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777 Partners e seus negócios

Uma aquisição bem-sucedida do Everton elevaria para oito o número de clubes no portfólio da 777. Seus times são bem conhecidos: Genoa na Itália, Hertha Berlin na Alemanha, Vasco da Gama no Brasil. Todos são diferentes em tamanho e ambição, mas partilhavam uma questão comum antes de atrair o interesse da 777: todos estavam em crise financeira.

Wander, 42, e seu cofundador Steve Pasko, um veterano de Wall Street duas décadas mais velho, não teriam sido vistos como investidores típicos de equipes esportivas quando fundaram a 777 Partners em 2015. Na época, os principais investimentos da empresa estavam relacionados com o mundo dos acordos estruturados, uma indústria opaca em que os beneficiários de anuidades de longo prazo, normalmente resultantes de pedidos de indenização, sacam-nas por quantias fixas de dinheiro imediato.

A empresa rapidamente se ramificou para outros setores, incluindo companhias aéreas de baixo custo e financiamento de litígios, de acordo com Gary Chodes, que atuou como membro do conselho de uma subsidiária da 777 até 2017. Ele disse que se retirou em bons termos, mas que a empresa que ele deixou tinha poucos negócios lucrativos. Por isso, ele notou quando a 777 começou a colecionar times de futebol e a se comprometer a assumir suas dívidas consideráveis por meio de empréstimos e outros pagamentos adiantados.

“Se eu perguntasse: ‘Existe algum mistério sobre como Josh geraria três quartos de um bilhão de dólares para comprar um time esportivo a partir dos negócios que ele possui na 777?’ – eu diria que é um tanto misterioso”, ele disse.

Em entrevistas anteriores, Wander pintou o retrato de um negócio bem-sucedido e em expansão, que administra 10 bilhões de dólares em ativos e conta com 60 subsidiárias em vários setores: esportes, seguros, aviação, meios de comunicação. Muitos dos detalhes financeiros da empresa são difíceis de verificar, uma vez que o negócio é privado e a sua estrutura financeira, segundo funcionários e ex-funcionários, é controlada de perto por Wander e Pasko. No fim de semana passado, por exemplo, foi anunciada a venda de uma de suas seguradoras sem a identificação dos compradores ou do preço.

A empresa depende de empréstimos para operar muitos de seus negócios, segundo funcionários atuais e ex-funcionários. Um dos maiores credores da 777 é a A-Cap, uma empresa privada que opera no setor de seguros e investimentos, disseram três pessoas. A A-Cap não respondeu a um pedido de comentário.

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“Nem todos os nossos 60 negócios serão lucrativos ao mesmo tempo, mas o desempenho essencial dos negócios subjacentes do Grupo 777 é sólido”, escreveu Wander na carta aos torcedores no sábado, acrescentando que a empresa não era uma “típica empresa de private equity”.

Problemas financeiros

No entanto, enquanto os executivos da 777 falaram da sua ambição e da escala das suas operações, algumas das empresas que dirigem, incluindo seus times esportivos, relataram pagamentos não realizados relacionados a cronogramas de financiamento acordados e até mesmo despesas operacionais de rotina.

Na Inglaterra, por exemplo, o presidente da Liga Britânica de Basquete, na qual a 777 detém uma participação de 45%, escreveu aos seus fundadores em 6 de setembro alertando que a liga corria risco de falência, a menos que a empresa fizesse um pagamento atrasado de cerca de US$ 1 milhão. Esses fundos acabaram chegando.

Na Bélgica, de acordo com reportagem da revista de futebol Josimar, a falta de clareza em relação às finanças da 777 assustou as autoridades de licenciamento do futebol belga a ponto de considerarem a possibilidade de recusar a permissão para que a empresa continuasse operando o clube de 125 anos de sua propriedade, o Standard Liège. Por fim, chegou-se a um acordo, e o time recebeu uma licença.

No Brasil, o Vasco da Gama aguardava ansiosamente um pagamento programado de cerca de US$ 23 milhões na mesma semana em que a liga de basquete esperava seus fundos. Sem o dinheiro, o Vasco não conseguiu fazer os pagamentos pendentes aos seus fornecedores e aos times rivais devidos em acordos anteriores por jogadores. Quando deixou de fazer alguns dos pagamentos, o órgão dirigente do futebol proibiu o clube de contratar novos jogadores até que suas dívidas fossem pagas.

Vasco vive seu primeiro ano na elite do futebol nacional sendo SAF Foto: Leandro Amorim/ Vasco

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Por meio de seu porta-voz, a 777 disse que já entregou grande parte do dinheiro exigido em seu cronograma de pagamentos com o Vasco. Também disse que estava “adiantada” e “além do nosso compromisso original” com a Liga Britânica de Basquete. Mas para algumas pessoas de fora, as repetidas questões envolvendo dinheiro sugeriam um exercício de manipulação financeira, em vez do tipo de proprietário saudável e bem capitalizado que um time da Premier League exige.

Multiplicando dinheiro

Longe do campo de futebol, seu cofundador, Wander, trigêmeo e filho de um dentista de Miami, construiu a imagem de algum que assume riscos e tem talento para ganhar dinheiro.

Uma ex-associada, Rhonda Bentzen, lembrou como Wander solicitava empréstimos a colegas de uma empresa de acordos estruturados que ele havia criado com a promessa de lucros em questão de dias. “Fiz isso com ele algumas vezes e ele dobrou o dinheiro em todas as vezes”, disse Bentzen. Mas uma vez, disse ela, viu Wander gastar cerca de US$ 5 mil em uma máquina caça-níqueis de Las Vegas, perder tudo em menos de um minuto e “nem pestanejar”.

Nos primeiros anos de sua carreira empresarial, Wander foi acusado por tráfico de cocaína em seus tempos de faculdade na Universidade de Miami. Depois de não contestar a acusação em 2003, ele passou mais de uma década em liberdade condicional. Um porta-voz da empresa disse que sua argumentação e a conclusão bem-sucedida de sua liberdade condicional significavam que ele “não foi condenado por nada”.

Os registros judiciais revelam outros detalhes sobre Wander, sua empresa e dinheiro. Em 2012, o cassino Bellagio processou Wander por não pagar um adiantamento em dinheiro de US$ 54.500. Em março, a American Express foi ao tribunal pedindo US$ 324.000,89 que haviam sido cobrados de um cartão de crédito da 777 Partners. O porta-voz da 777 disse que ambos os assuntos foram resolvidos. Documentos judiciais mostram que o reembolso do Bellagio permaneceu pendente por pelo menos seis anos.

Na semana passada, um antigo parceiro comercial do negócio aéreo da 777 fez uma alegação de fraude contra a empresa no Tribunal de Chancelaria em Delaware. O processo afirma que a empresa e uma subsidiária, a Phoenicia LLC, “fazem parte de uma rede de empresas que a 777 usa para movimentar dinheiro e ativos para operar e ocultar uma empresa fraudulenta em expansão”. Um porta-voz da 777 se recusou a responder à acusação, citando uma política da empresa de não comentar litígios.

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O padrão de pagamentos atrasados e adiados, mais do que qualquer ação judicial, levanta as maiores dúvidas sobre a adequação da 777 para dirigir o Everton, disse Keiron Maguire, professor da escola de administração da Universidade de Liverpool e especialista em finanças do futebol. “É um sinal de alerta para um problema de fluxo de caixa potencialmente mais significativo ou para uma administração incompetente”, disse ele.

RIO DE JANEIRO RJ 18-03-2022 ESPORTES VASCO Executivos da 777 Partners conhecem São Januário – 18/03/2022
Os representantes da 777 Partners seguiram a rotina de visitas e reuniões com o Vasco da Gama na manhã dessa sexta-feira. Joshua Wander, Steven Pasko, Juan Arciniegas e mais cinco executivos da empresa americana estiveram no Complexo de São Januário acompanhados do Presidente Jorge Salgado, dos Vice-Presidentes Carlos Roberto Osório e Roberto Duque Estrada, Vice-Presidentes de outras pastas e do Gerente Geral da Base, Rodrigo Dias, além do maior ídolo e artilheiro da história do Clube, Roberto Dinamite
FOTO Rafael Ribeiro / Vasco Foto: RAFAEL RIBEIRO / undefined

O dinheiro é uma preocupação primordial no Everton no momento. O atual proprietário do clube, Farhad Moshiri, gastou perto de US$ 1 bilhão no Everton desde a compra do time em 2016, e as necessidades financeiras imediatas do clube são tão agudas que a 777 já emprestou ao time mais de 20 milhões de libras (quase US$ 25 milhões) apenas para que ele possa continuar a operar.

Ao concordar em assumir as suas crescentes dívidas, bem como uma folha salarial da Premier League e um estádio inacabado na zona portuária de Liverpool, a 777 Partners comprometeu-se basicamente a injetar centenas de milhões de dólares no clube. No fim de semana passado, eles viram o trabalho pela frente em primeira mão, assistindo a uma partida do Everton da primeira fila do camarote do diretor.

Executivos do Vasco da Gama, no Brasil, estavam observando. Não passou despercebido que o empréstimo de US$ 25 milhões que a 777 Partners concedeu ao Everton no mês passado era semelhante a um valor que, naquele momento, ainda era devido ao Vasco.

Na quinta-feira, um mês depois do vencimento, chegou parte do pagamento, com a promessa de que o restante seria pago na manhã de sexta-feira. Mas não foi pago. O motivo do atraso, disse a 777 Partners, foi um feriado bancário nos Estados Unidos. Os US$ 7 milhões que faltavam, garantiu a empresa ao Vasco, estariam lá esta semana.


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